terça-feira, 22 de junho de 2010

Aos que perdem por orgulho...


Corre o tempo. Perguntei-me se eu ia terminar os meus dias assim: como um destes personagens de Jane Austen, escapulidos das páginas de um livro à procura de uma possibilidade de amor. Desde que ele se foi, passaram-se vários dias sem que eu tivesse notícias dele. Encantoei os olhos na ponta da escrivaninha e avistei um aparelho telefônico que me reparava de esguelha, com a testa franzida, como se quisesse me mostrar algo inovador que ainda não fiz: "telefonar". Imediatamente, recobrei o juízo: "como uma coisa tão simples pode se tornar tão difícil" ? Derramei na alma uma coragem, que no fundo não tinha. Peguei o telefone e respirei fundo. Foi quando a própria respiração tentou me sufocar. Hesitei, e por um instante não consegui engolir nem a própria saliva, tinha a consistência de aço inoxidável ferrítico ACE -P4 39A. Suspirei perdida, formulando minhas dúvidas em voz baixa: "este telefone não existe, é só uma miragem que insisto em teclar". Mas tratava-se de uma emergência. Eu não podia partir sem deixar ao menos um coração a inventariar. Antes de falar, parei um instante para recuperar o fôlego e conjugar os verbos que se revoltaram e fizeram uma rebelião no céu da boca, fazendo de refém a minha língua que ficou presa entre os dentes. Não penso, logo, eu ligo. E abençoados sejam meus ouvidos! Finalmente consegui discar o seu número. Tive a impressão de que meus dedos se afundavam entre as teclas enquanto as garras do fio se embaraçavam em meu pescoço, apertando minha garganta como um cipó espinhento. Eu o levei com pouca ou nenhuma coragem até o ouvido, e por sorte, tinha um sinal anêmico de: "fora de área". A secretária eletrônica atendeu. Minha voz ficou dependurada de cabeça para baixo na caixa postal, matando enforcado o seguinte recado: "me deixaria voltar a vê-lo, se eu pedisse"?


P.S.: Vocês estão de prova. Eu tentei.

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