sexta-feira, 23 de dezembro de 2011

Olhe.




(...) Ela tem andado pelos quatro cantos da cidade procurando as luzes, os sons ou qualquer outra coisa que lhe traga inspiração para retornar ao quarto quente de sua casa. Sem se preocupar muito para onde estava sendo levada, olhava as pessoas em seu redor fascinada com o brilho que elas tinham, reconhecendo algumas de um sonho ou outro que tivera desde que se permitia sonhar.
Estava quase feliz por estar ali. Quase. Enquanto via aquele mundo intenso e deslumbrava-se com toda aquela movimentação, sentia-se completamente sozinha diante de tudo. 

"Ele não está aqui, não é?" perguntou uma voz que reconheceu de um de seus sonhos. Ela não sabia o que dizer, ele simplesmente nunca esteve e é surpreendente que ela ainda sentisse sua ausência. Sem virar para a voz fez que sim com a cabeça e escondeu-se em seus cabelos com os olhos fechados como se sentisse vergonha. O dono da voz levantou seu rosto, tirou seu cabelo revelando o rosto da mulher que estava diante dele. "Abra os olhos, eu estou aqui agora." ele disse sorrindo.

terça-feira, 20 de dezembro de 2011



Portanto, agora, ali estava eu. Sentado ouvindo a chuva. Se eu morresse agora, ninguém verteria uma lágrima em todo o mundo. Não que precisasse disso. Mas era estranho. Até onde um trouxa pode ficar solitário? Mas o mundo estava cheio de velhos rabugentos como eu. Sentados ouvindo a chuva e pensando para onde foi todo mundo. Aí é que a gente sabe que está velho, quando fica pensando para onde foi todo mundo. Bem, não foram para lugar nenhum, não precisavam ir. Três quartos estavam mortos.

Mas seus olhos não mentem o cansaço da espera e a tristeza de estar solta, e você fica feia. É ter a sensação de que ninguém te olha, pelo menos não como você gostaria de ser olhada. Estar sozinha é estar solta e, no entanto, é estar amarrada ao chão porque nada te faz flutuar, sonhar, divagar. Estar sozinho, ou estar sozinha, pode acontecer com qualquer um. E você torce para que aconteça com a sua melhor amiga, ou com aquele homem que você gostaria de experimentar como uma pílula para a sua solidão. Estar sozinha é não suportar ouvir a palavra solidão porque ela faz sentido. E o sentido dela dói demais. Estar sozinho é ter uma risada nervosa, de quem segura um grito e um choro enquanto ri. Um riso falso para se convencer de que é possível ficar sozinho sem ficar deprimido […] É conferir a caixa de e-mails com uma freqüência que beira a compulsão. É chorar do nada. É acordar do nada.

segunda-feira, 12 de dezembro de 2011

Rotina desarrumada.


Você não ligaria no dia seguinte, era domingo, fui até a cozinha lavar a louça, mas não havia louça para lavar, o combinado era jantarmos fora na noite anterior, não jantamos, ninguém se alimentou, quanto tempo desde aquela noite, parece um século, foi ontem. (...)Telefono pra minha mãe, não telefono pra você. Conto pra ela que acabamos, meu relato é muito coerente, ela lamenta mais ou menos, já ouviu eu contar essa história antes. Somos reincidentes em finais, mas agora é pra valer, quem me acredita?
Eu não me acredito, mas agora não te quero mesmo, e eu já ouvi isso antes, de você, de mim. Agora não tem mais volta — dei tantas voltas no parque, é tão ridículo caminhar pra lugar nenhum, para quem vou ficar magra e saudável? E voltei a dizer: não, mãe, acabou de verdade. E pela primeira vez naquele domingo eu fraquejei, as palavras saíram entrecortadas, eu catava as sílabas que me fugiam, e ela do outro lado da linha fingia que não doía nela também.

terça-feira, 6 de dezembro de 2011

Fragmentos de um mar de pensamentos nublados.


É como se ela lhe implorasse pra ficar sem dizer nada, só com o olhar, mas ele não foi capaz de perceber o quanto ela o queria por perto, o quanto ela precisava dele ali.
E então ele partiu sem olhar pra tras, confiante nos seus passos largos que a afastavam dela. Deixou-a desapontada por um segundo, mas ela sabia que não deveria esperar que ele ficasse, afinal sabia o final da história que lhe foi contada como uma lenda amaldiçoada.
Ao perdê-lo de vista, restou-lhe as lembranças irreais que estavam guardadas em algum lugar do seu cérebro complexamente desorganizado. Lembranças de um gosto, um cheiro, um toque. Lembranças do que nem aconteceu, mas que em uma noite chuvosa ela desejou com todas as suas forças que acontecessem um dia.